ARNILDO E O PORCO

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A crise na suinocultura fez com que lideranças do setor decidissem vir a Porto Alegre, para entregar pedidos aos deputados. Lotaram dois ônibus, com produtores, e, visando obter maior espaço na mídia, também trouxeram alguns leitões, para chamar a atenção ao problema. O truque funcionou e houve ampla cobertura da imprensa.

Em meio aos flashes e às câmeras, um leitão escapou e disparou em direção à Catedral. Arnildo, o rapaz que o trazia, saiu correndo para tentar recuperá-lo. O bichinho assustado desceu a rua Espírito Santo e ganhou velocidade. Foi somente lá nas proximidades do Centro Administrativo, que voltou às mãos de seu dono; já ofegante e muito cansado resolveu passar uma corda no pescoço do porquinho, para que não fugisse mais.

Enquanto isso, na praça da Matriz a manifestação havia se encerrado e os ônibus voltaram para o interior. Ninguém percebeu a ausência do Arnildo, pois os que estavam num ônibus supunham que ele estivesse no outro. Assim, sem conhecer a cidade, Arnildo e seu leitão, estavam ao final da tarde andando pela Cidade Baixa. Nem tentou ir até a rodoviária, pois sabia que não era permitido viajar de ônibus acompanhado de animais.

Foi caminhando, deslumbrado com a quantidade de bares e pessoas reunidas. Perdidos na cidade grande, ele e o porco estavam assustados. O espanto generalizado e a curiosidade que estavam provocando, aumentavam sua insegurança. Tornaram-se objeto da curiosidade geral. As pessoas saiam das mesas e iam olhá-los, ante o inusitado daquela cena. Os olhares de espanto o intimidavam e não sabia o que fazer.

Até que encontrou um grupo estranho, com piercings e tatuagens, que o saudou amigavelmente. Esses tipos alternativos acharam genial a idéia de alguém usar um porco como animal de estimação. E, assim, foi acolhido pela turma e de uma hora para outra, o ingênuo Arnildo, deixava o interior de Teutônia para se transformar na celebridade do momento de um grupo punk.

O diálogo entre eles foi um pouco prejudicado, pois embora a conversa fosse, supostamente, no mesmo idioma, ele não entendia nem metade do que falavam. Mas sentiu-se bem, ao ser acolhido pelos tipos exóticos, que achavam normal o que os outros estranhavam.

Uma magrinha pálida, de cabelo roxo e olhos muito pintados, simpatizou com Arnildo e resolveu ficar junto dele. Convidou-o para caminhar pelas calçadas, para conhecer a região. Ia ao seu lado, curtindo a companhia e também a sensação que causavam, de chocar as pessoas, ao exibir o porco na coleira.

O insólito casal, com o mais insólito animal de estimação fez enorme sucesso pelas ruas e bares da Cidade Baixa.

Comeram xis e beberam cerveja. Ao final da noite, como não tinham onde ficar, ela decidiu levá-los para sua casa.

O porteiro do edifício não permitiu a entrada. Ela insistiu e ameaçou fazer escândalo. Apareceu o síndico, que disse que a convenção de condomínio só admitia no prédio cães, gatos e passarinhos, que ele, pedantemente, chamava de: aves canoras.

Barrados na portaria, ela, ele e o porquinho foram embora.

Uma hora mais tarde entraram pela garagem. Tinham acomodado o leitão numa dessas gaiolas/maleta, usadas para transporte de animais em carros.

Deixaram a gaiola na área de serviço e foram deitar.

Assim, ao fim de um dia inesquecível, o jovem suinocultor e garota punk uniram seus sonhos.

Enquanto isso, o animalzinho exausto sucumbiu de sono. Adormeceu mal acomodado naquele espaço exíguo; pois para burlar o regimento interno do edifício, colocaram o porco numa gaiola, para, deste modo original, transformá-lo em ave canora...

Música: MORNING ISLAND – Sadao Watanabe



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