GUARULHOS – CASABLANCA
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Cruzaram-se na escada rolante do aeroporto.
Não se viam há mais de vinte anos.
Os sorrisos de ambos iluminaram-se, como se uma luz tivesse acendido e focado nas suas bocas.
Ele voltou, para encontrá-la no topo da escada.
Ela ficou esperando.
Apenas pronunciaram os nomes um do outro.
Deram-se as mãos.
Quanto tempo, quanta história.
Tinham vivido pedaços enormes de suas vidas e quantas coisas teriam para contar.
Apenas sorriam e voltavam no tempo.
Seguiam com as mãos dadas.
O aeroporto fervilhava de gente.
Ele tomou a iniciativa e puxou-a pela mão.
Ela foi se deixando levar como se estivesse de patins.
Ele, usando um cartão bancário, abriu a porta da cabine do caixa automático, que ficava um pouco fora do saguão principal do aeroporto.
Não havia ninguém por perto.
Entraram os dois.
Abraçaram-se e beijaram-se longamente.
Aquele momento esperara mais de duas décadas e acontecia de forma repentina.
Chegou alguém querendo usar o caixa do banco.
Tiveram de sair.
Cada qual com seu vôo e seu horário de embarque.
Não tinham muito tempo.
Era uma paixão forte e estranha que aquele encontro casual havia despertado neles; talvez ela fosse aumentada por saberem que não havia muito tempo e logo teriam de se separar. Seguiam de mãos dadas.
Voltaram a ter a idade de quando se conheceram.
Flutuavam no aeroporto sem ligar para nada, com se fossem personagens de um filme.
Ele lembrou-se de quando perdeu uma mala e foi conduzindo-a até o balcão das bagagens perdidas.
Explicou ao responsável pelo setor, que estava procurando uma mala perdida na semana anterior, mas estava sem o comprovante da reclamação.
Insistiu que queria olhar o depósito, pois poderia reconhecer sua mala e seu nome estava dentro dela.
Inicialmente o funcionário não concordou, mas acabou cedendo, na certeza que desistiriam ao ver a quantidade de malas que iriam encontrar lá dentro.
Realmente era uma floresta de malas, protagonistas involuntárias de tantos transtornos e aborrecimentos de seus proprietários, que haviam se desencontrado delas.
Foram avançando até o fundo do depósito e, como duas crianças brincando de cabana.
Acomodaram-se entre alguns volumes, criando um espaço, para poder ter a intimidade desejada.
Enfim sós!
Cada segundo valeu por uma hora.
Nem mesmo a idéia que pudessem estar sendo vistos por alguma câmera de segurança os inibia.
Até os excitava, naquele ardor febril que os movia.
Era uma loucura juvenil, que os remoçava e impelia.
Mais tarde deixaram o local, alegando não ter encontrado a mala perdida. Riam felizes como moleques molhando-se na chuva.
O horário do embarque se aproximava, os destinos eram diferentes.
Comentaram que despedida em aeroporto lembrava o filme Casablanca.
Porém não usavam chapéu nem capa de chuva, e também não há mais aviões com hélice para a cena romântica na pista.
Foram até a janela, o isolamento acústico do vidro não permitia ouvir o rugido das turbinas dos jatos.
Tinham de partir.
Beijaram-se cinematograficamente, ignorando todos que estivessem por perto.
Antes de se despedir trocaram os números de seus telefones celulares e endereços eletrônicos.
Cada qual tomou o caminho de seu portão de embarque e seguiram em seus vôos.
Na semana seguinte ela mandou um email, com uma música anexada, que poderia ser baixada como toque de campainha de celular.
A partir de então, quando tocam seus celulares, ouve-se o som de “As time goes by”.
MÚSICA: AS TIME GOES BY – Tony Bennet
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