jogo de botão

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Abri a caixinha, fui tirando e colocando sobre a mesa. Ah! o velho time de botão, saído de algum lugar perdido na prateleira da garagem, tinha voltado. Os personagens da infância estavam ali, coloridos e estáticos para os outros, animados e com vida para nós, que os comprávamos na fábrica de puxadores da rua Paulino Teixeira, onde ficavam expostos naquele balcão exíguo como objeto de desejo. Meu time era quase todo de puxadores, dois eram da gaveta de costura da minha mãe e mais um feito da tampa de um vidro.

Eles tinham nome e faziam parte do nosso patrimônio afetivo e imaginário, numa época em que nem ligávamos para patrimônio e o que era imaginário. O campo, igual ao de futebol, era feito de chapa de compensado; ali os botões viravam protagonistas, quando apertávamos a ficha sobre eles, para baterem naquele botãozinho menor, que era a bola, para encobrir o goleiro, em geral uma caixa de fósforos. A imagem daqueles objetos redondos espalhados na mesa, pode não fazer sentido para os outros, mas para nós está carregada de fantástico significado.

A ideia de jogar botão com um amigo de infância foi ótima, o jogo nem tanto. Na ausência de campo usamos a mesa de jantar, mas ficou sem a mesma graça, assim como os dedos não conservaram a destreza das mãos miúdas, que manipulavam os botões fazendo gols incríveis e propiciando momentos de grande alegria. Se a partida não teve o encanto de outrora, o reencontro foi legal.

Depois que ele foi embora, fiquei olhando os velhos botões coloridos na mesa improvisada; pareciam deslocados, fora do seu ambiente primitivo. Então veio a lembrança daquelas tardes distantes em que nos reuníamos para jogar botão, curtindo emoções infantis. As partidas só terminavam quando alguém surgia com uma bola e íamos até o campinho do terreno baldio, jogar futebol de verdade.

A escolha dos times era feita no par-ou-ímpar e disputávamos cada jogo como se fosse final de campeonato. Não havia juiz, nem relógio e acabavam ao anoitecer, quando as mães, nas janelas, chamavam os filhos para o banho e o jantar.

Sem camisa, pés descalços e bola sem marca, a simplicidade estava presente em tudo de forma natural. Naquelas partidas a bola era o mundo e, talvez inconscientemente, conquistando a bola pensávamos estar conquistando o mundo.

Era tudo tão diferente de hoje, em que os valores artificialmente criados, como luxo e riqueza, estimulam a competição. Lembrando aquele tempo e comparando com a atual disputa insaciável pelo que for mais sofisticado, chego à conclusão que é um esforço em vão, pois é muito difícil alcançar. A suprema sofisticação não se pode comprar e só a conquista quem conseguir sentir e vivê-la de forma autêntica. Afinal, nada é ou será mais intrinsecamente luxuoso e sofisticado do que a simplicidade.

Música – STARDUST – Willie Nelson



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