PAU DE FÓSFORO

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De vez em quando, costumava passar à noite pela av. Protásio Alves um tipo bastante engraçado. Era um negrinho magro, baixinho , já meio velho, normalmente já tendo tomado "umas que outras" e conhecido pelo apelido de Pau de Fósforo. Quando cruzava diante do bar Coruja, onde nos reuníamos, cumprimentava dizendo :

"Oi, gurizada!".

E sempre, mesmo sem combinar , após a saudação, alguém da turma fingia comentar em voz alta:

"Pô, quem diria, esse cara aí já defendeu um pênalti do Pelé!"

Era como uma senha. Ele se virava, já perguntando:

- "Vocês sabiam é ?"

E iniciava o seu espetáculo.

Chamava todo mundo. Ia para a porta fechada de uma loja ao lado, onde simulava uma goleira, encostava-se na cortina de metal e começava a descrever:

"Eu tava jogando no Palmeiras. Era contra o Santos. O juiz deu pênalti. E veio o negrão bater."

Era praxe alguém perguntar: - "Qual negrão ?"

-"Era o Pelé" Dizia ele. "O Pelé. O jogo era contra o Santos". Respondia, como se fosse alguma coisa óbvia. E seguia descrevendo o lance :

"Então ele tomou distância. Correu. Deu aquela paradinha dele. Eu olhei bem para a bola, senti que vinha na esquerda. Então,me atirei e peguei ela aqui ó.“

E se jogava no chão, mostrando suas mãozinhas magras, com os dedos crispados, segurando uma bola imaginária, deitado na calçada, após a sua defesa extraordinária...Era um fantástico faz-de-conta.

Nós todos aplaudíamos, corríamos até ele e o carregávamos até o balcão do Coruja, onde alguém sempre lhe pagava uma cerveja e um cachorro quente.

Depois de beber e comer ele agradecia e ia embora. Só voltava tempos depois.

Sempre que havia alguém estranho, ficava embasbacado ao assistir aquele espetáculo patético, que nós - guris à época - já estávamos acostumados.

Lembrei dessa história, quando vi no jornal a foto de um deputado carregando com toda cerimônia o Orçamento Geral da União, para ser encaminhado ao Poder Executivo.

No fundo, parecia um pouco com a bola que o Pau de Fósforo costumava defender na calçada da Protásio.

MÚSICA: A TOI DE CHOISIR – Richard Anthony



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